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Reduzir carboidratos é mesmo a melhor recomendação? Uma lacuna na formação médica.

  • santos-lobato
  • 21 de mar.
  • 3 min de leitura


A nutrição é um dos pilares fundamentais da Medicina do Estilo de Vida (MEV), e o aconselhamento alimentar faz parte da prática médica cotidiana. No entanto, será que os estudantes de medicina estão recebendo a formação necessária para orientar seus pacientes de maneira adequada?


Um estudo observacional investigou a experiência de estudantes de medicina no aconselhamento sobre mudanças no estilo de vida. A pesquisa foi realizada em três escolas médicas que utilizam metodologias ativas de ensino. Apenas estudantes do ciclo clínico e do internato foram incluídos, totalizando uma população de 1.500 alunos, dos quais 322 participaram voluntariamente.


Os estudantes responderam a um questionário abordando sua experiência prática e o grau de segurança quanto às habilidades de aconselhamento para pacientes com fatores de risco para doenças crônicas. As perguntas estavam distribuídas em quatro pilares da MEV: alimentação, atividade física, repouso e sono, e cessação de tóxicos.


O Que os Estudantes de Medicina Mais Recomendam?


Os dados coletados revelaram que 99,9% dos estudantes já tiveram oportunidade de aconselhar pacientes sobre nutrição, e em 52,9% dos casos, o paciente seguiu pelo menos parte das recomendações. No entanto, 33,7% dos estudantes não tiveram oportunidade de avaliar esses pacientes em consultas de retorno, o que limita a possibilidade de ajustes e aprendizado com a experiência clínica.


Quando questionados sobre quais orientações alimentares mais frequentemente fornecem aos pacientes, as palavras mais mencionadas foram “ingestão”, “redução”, “alimento” e “carboidrato”. A ênfase na redução do consumo de carboidratos como principal estratégia alimentar levanta um alerta importante. Embora a restrição de carboidratos seja uma abordagem amplamente utilizada para a perda de peso, as diretrizes nutricionais não fornecem recomendações claras sobre o quanto essa redução deve ocorrer para garantir uma alimentação saudável e sustentável.


O Perigo de Associar Saúde à Redução de Carboidratos


Carboidratos são macronutrientes essenciais e estão presentes em alguns dos alimentos mais saudáveis da nossa rotina alimentar, como frutas, vegetais e grãos integrais. Associar a redução de carboidratos a uma alimentação saudável pode ser problemático, pois pode levar a restrições desnecessárias e até mesmo a uma piora na qualidade da dieta.


A evidência científica mostra que a qualidade dos carboidratos importa mais do que a quantidade. Dietas ricas em carboidratos integrais, como frutas, legumes, verduras e grãos integrais, estão associadas a menor risco cardiovascular, melhor controle glicêmico e maior longevidade. Por outro lado, restringir excessivamente os carboidratos pode levar à redução da ingestão de fibras, vitaminas e compostos essenciais à saúde.


O Guia Alimentar para a População Brasileira, por exemplo, recomenda o consumo prioritário de alimentos in natura e minimamente processados, sem enfatizar a contagem ou a restrição de macronutrientes. A orientação é focada na qualidade dos alimentos, incentivando um padrão alimentar equilibrado e culturalmente adequado.


Além disso, a formação médica tradicional tende a abordar a nutrição sob uma perspectiva biomédica, enfatizando o papel dos macronutrientes na fisiopatologia das doenças crônicas, sem aprofundar estratégias práticas de aconselhamento. Essa lacuna na formação pode explicar por que muitos estudantes acabam se apoiando em recomendações genéricas e não necessariamente alinhadas às melhores evidências científicas.


Como Melhorar a Educação Nutricional na Medicina?


Abordagem individualizada e baseada em evidências

  • Ensinar os estudantes a adaptarem recomendações alimentares ao contexto, preferências e cultura do paciente.

  • Evitar prescrições genéricas e restritivas, priorizando a qualidade dos alimentos.


Foco na qualidade dos alimentos, não apenas na quantidade

  • Destacar a importância de carboidratos integrais (frutas, verduras, legumes e grãos integrais).

  • Desmistificar o conceito de que reduzir carboidratos é sempre benéfico para todos.


Integração da nutrição ao currículo médico desde cedo

  • Incorporar conceitos de nutrição clínica nos primeiros anos da graduação.

  • Estimular o aprendizado prático sobre aconselhamento nutricional em estágios e ambulatórios.


Uso de metodologias ativas de ensino

  • Simulações, role-playing e casos clínicos para desenvolver habilidades de aconselhamento.

  • Discussão de diretrizes nutricionais com base na melhor evidência disponível.


Medicina Culinária como ferramenta educacional

  • Oficinas práticas para ensinar como transformar teoria em orientações aplicáveis.

  • Envolvimento interdisciplinar com nutricionistas para reforçar conceitos e boas práticas.


Treinamento para comunicação eficaz no aconselhamento nutricional

  • Ensinar técnicas de entrevista motivacional para incentivar mudanças sustentáveis.

  • Evitar linguagem prescritiva e promover diálogo aberto com os pacientes.


Diante desses achados, fica evidente que a formação médica ainda precisa evoluir para que os futuros profissionais possam fornecer orientações alimentares baseadas em evidências e alinhadas às necessidades reais dos pacientes. Uma abordagem mais abrangente e integrada da nutrição nos currículos dos cursos de medicina pode ser um passo fundamental para garantir um aconselhamento alimentar mais eficaz e personalizado.


Afinal, não basta apenas dizer "reduza carboidratos"—é preciso ensinar como construir um padrão alimentar saudável e sustentável para cada paciente.


Artigo completo: DOI: 10.22478/ufpb.2359-7003.2024v33n1.66191

 
 
 

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